UNICAMP – 2018/2019
REDAÇÃO 1 – ABAIXO-ASSINADO
REDAÇÃO 2 – POSTAGEM
ABAIXO, REDAÇÃO 1
ABAIXO-ASSINADO
– DOUTRINAÇÃO IDEOLÓGICA EM SALA DE AULA
ID: ERW
Você é um(a) estudante do
Ensino Médio na rede pública estadual e soube de um acontecimento revoltante na
sua escola: sua professora de Filosofia recebeu ofensas e ameaças anônimas por
suposta tentativa de doutrinação política, ao ter iniciado o curso sobre as
origens da Cidadania e dos Direitos Humanos modernos, com o texto a seguir:
Teócrito e o
pensamento
A ninguém, nem aos deuses
nem aos demônios, nem às tiranias da terra nem às tiranias do céu, foi dado o
poder de impedir aos homens o exercício daquele que é o primeiro e o maior de
seus atributos: o exercício do pensamento.
Podem amarrar as mãos de um
homem, impedindo-lhe o gesto. Podem atar-lhe os pés, impedindo-lhe o andar.
Podem vazar-lhe os olhos, impedindo a vista. Podem cortar-lhe a língua,
impedindo a fala. O direito de pensar, o poder de pensar, porém, estão acima de
todas as violências e de todas as repressões, que nada podem contra seu
exercício. (…) Parece claro que não há abuso mais abominável que o de tentar
impor limitações ao pensamento de qualquer pessoa.
Pretender suprimir o
pensamento de quem quer que seja é o maior dos crimes. Pois não é apenas um
crime contra uma pessoa, mas contra a própria espécie humana, uma vez que o
pensamento é o atributo que distingue o ser humano dos demais seres criados
sobre a face da terra. (…)
Na vida na cidade, se um
homem neutraliza dentro de si o direito de pensar, a cidade pode ser tomada e
dominada pela ferocidade de um tirano, cujo despotismo levará o povo à morte
pela fome, pela crueldade ou por outras formas de injustiça e prepotência. E se
não o povo todo, pelo menos uma parte do povo, certamente, será arrastada à
opressão, à tortura, ao cárcere ou a qualquer outra forma de perdição. Os
tiranos não gostam que as pessoas pensem.
(Teócrito de Corinto,
filósofo grego, século II d.C.)
A direção da escola ainda
não se manifestou publicamente sobre o episódio. Indignado(a) com a tentativa
de censura que a professora sofreu por propor aos alunos reflexões fundamentais
à formação cidadã, você decidiu escrever o texto de um abaixo-assinado
encaminhado à direção da escola, em nome dos estudantes, no qual deve:
a) reivindicar que a escola
se posicione publicamente em defesa da professora;
b) reivindicar a manutenção
de aulas de Filosofia que tematizem os Direitos Humanos;
c) justificar suas
reivindicações.
Para tanto, você deve levar em conta tanto o texto acima quanto
os excertos abaixo.
1. A instrução será
orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do
fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades
fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade
entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as
atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.
Declaração Universal
dos Direitos Humanos, Artigo XXVI, item 2, 1948.
2.

Alexandre Beck.
Disponível em pa.unicamp.br/direitos-humanos-armandinho-na-upa. Acessado em
24/11/2018.
3. No que toca aos direitos
humanos, a filósofa Hannah Arendt identificou na ruptura trazida pela
experiência totalitária do nazismo e do stalinismo a inauguração do tudo é
possível, que levou pessoas a serem tratadas como supérfluas e descartáveis.
Tal fato contrariou os valores consagrados da Justiça e do Direito, voltados a
evitar a punição desproporcional e a distribuição não equitativa de bens e situações.
Arendt propõe assegurar um mundo comum, marcado pela pluralidade e pela
diversidade, o qual, através do exercício da liberdade, impediria o
ressurgimento de um novo estado totalitário de natureza. No mundo
contemporâneo, continuam a persistir situações sociais, políticas e econômicas
que, mesmo depois do término dos regimes totalitários, contribuem para tornar
os homens supérfluos e sem lugar num mundo comum, como a ubiquidade da pobreza
e da miséria, a ameaça do holocausto nuclear, a irrupção da violência, os
surtos terroristas, a limpeza étnica, os fundamentalismos excludentes e
intolerantes.
Adaptado de Celso
Lafer, A reconstrução dos direitos humanos: a contribuição de Hannah Arendt.
Estudos Avançados, v. 11, n. 30, São Paulo, p. 55-65, maio/ago. 1997.
4. O bicho está pegando na
educação. Fico pensando em que mundo vivem os que acham que as escolas
brasileiras sofrem de “contaminação político-ideológica” comandada por “um
exército organizado de militantes travestidos de professores”. É uma baita
contradição para quem diz defender a “pluralidade”, e é o caminho oposto dos
países de alto desempenho em educação: Estados Unidos (em que alguns Estados
oferecem educação sexual desde o século XIX), Nova Zelândia, Suécia, Finlândia
e França. No Brasil, querem interditar o debate. Mesma coisa com os estudos
indígenas e africanos, classificados aqui como porta de entrada para favorecer
“movimentos sociais”. Já na Noruega, o currículo é generoso com o povo sami,
habitantes originais do norte da Escandinávia. “Doutrinação”, por lá, chama-se
respeito à diversidade e às raízes da história do país. Para piorar, o
principal evangelista dessa “Bíblia do Mal” seria Paulo Freire. Justo ele,
pacifista convicto e obcecado pela ideia de que as pessoas deveriam pensar
livremente. Presos na cortina de fumaça da suposta doutrinação, empobrecemos um
pouco mais o debate sobre educação.
Adaptado de Blog do
Sakamoto.
Disponível em
https://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br. Acessado em 05/07/2018.