Um guia para você se proteger sozinho das fake news
(Hélio Gurovitz)
Notícias falsas
infestam as redes sociais feito gafanhotos. Na tentativa de deter a praga,
Facebook e Twitter, atarantados e atabalhoados, adotam medidas drásticas, que
deixam no ar aquele cheiro inconfundível da borracha queimada dos tempos da
censura. Autoridades eleitorais no mundo todo, assustadas com a intervenção de
hackers e robôs na eleição de Donald Trump e no plebiscito do Brexit, buscam um pesticida
milagroso para exterminar o acrídio onipresente que batizaram de fake news. Em
vão. Em apenas um ano, os países afetados por campanhas digitais de manipulação
e desinformação saltaram de 28 para 48, de acordo com um levantamento da
Universidade de Oxford, entre eles, destaca-se o Brasil, bem às vésperas da
eleição presidencial mais angustiante desde a redemocratização. A imprensa
profissional, porto seguro para quem buscava informações confiáveis, enfrenta
uma crise de imagem e credibilidade sem paralelo. Em quem confiar? Como se
proteger em meio à revoada irrefreável de mentiras, falsidades ou propagandas
disfarçadas de notícias? Por mais que empresas ou governos tentem resguardar o
cidadão, o ambiente se tornou inexoravelmente mais hostil. Sites e ferramentas
de checagem, concebidos como antídotos à peçonha, parecem apenas alimentar o
coro de reprovação, que brada “fake news” diante de qualquer notícia, análise ou
opinião que desagrade. As regras mais triviais para regular o meio digital e
disciplinar a disseminação de mentiras são vistas como expressão de censura ou
viés ideológico. Não é que governos ou empresas estejam errados. É que
simplesmente podem ser inúteis – algo como tentar curar um viciado em álcool
apenas dando conselhos para que largue a bebida. A demanda por conteúdo que
confirme as crenças da audiência é inesgotável, bem maior que a demanda pela
verdade. Quem está interessado em fatos reais e informações fidedignas tem de
aprender rudimentos de jornalismo para se proteger sozinho da infestação de
mentiras e da manipulação no meio digital. Felizmente, o próprio avanço
tecnológico torna isso mais fácil. “As pessoas terão de adquirir suas próprias
notícias, até certo ponto, e deverão, portanto, aprender técnicas jornalísticas
e os vários truques do ofício”, escreve o economista Bruce Bartlett em The
truth matters (A verdade importa), um guia com 15 dicas práticas para separar
fatos de mentiras e combater a praga das fake news. Veterano de mais de 40 anos
em Washington, Bartlett lidou com a imprensa em todos os cargos que ocupou na
Câmara, no Senado e na Casa Branca. Foi um dos artífices do corte de impostos
no governo Ronald Reagan e um crítico veemente da política econômica no governo
George W. Bush. Mesmo antes da eleição de Trump, rompera com os republicanos,
sem aderir aos democratas. Vê a imprensa de fora. O maior valor de suas dicas
está justamente no olhar externo e sofisticado de alguém com tarimba suficiente
para entender por dentro o funcionamento do jornalismo profissional, para
reconhecer suas qualidades e limitações, sem cair na histeria bocó de quem
enxerga a “mídia” como mera máquina de pregação ideológica e manipulação. Seus
conselhos são expostos de modo prático e sucinto. É preciso saber distinguir
entre fontes primárias e secundárias; usar corretamente sites, documentos, a
Wikipédia ou bibliotecas públicas; compreender convenções jornalísticas, como
“on” e “off”, o equilíbrio artificial em reportagens ou o emprego de termos vagos,
como “esquerda” e “direita”; saber confiar em acadêmicos e entender os
interesses de institutos privados; desconfiar de pesquisas e pôr números em
contexto; confiar mais em opiniões assinadas que em anônimas; e, sobretudo,
saber apontar a diferença entre notícias e boatos, notícias e propaganda,
notícias e opinião. “As melhores defesas contra fake news são: pensamento
crítico; obter as notícias de uma variedade de fontes, incluindo aquelas que
não confirmam suas próprias crenças; ser cético quanto à informação que parece
boa (ou ruim) demais para ser verdade.”
Revista Época, n. 1049, 6 ago. 2018, p. 44. Adaptado.
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PROPOSTA DE
REDAÇÃO: A partir das ideias contidas no texto acima, argumente, em 20 linhas,
sobre como podemos conviver com as fake news no dia a dia, sem que nos tornemos
alheios à realidade.