LITERATURA E INVISIBILIDADE SOCIAL
MODELO FAMERP
ID: G4U
Texto I
Fugindo de idealizações
românticas ou de exotismos regionalistas, as obras A Hora da Estrela, de
Clarice Lispector, e Vidas Secas, de Graciliano Ramos, expõem, duramente, a
situação de miséria e exploração dos migrantes nordestinos no Brasil – e a situação
que não muda; apenas se transforma com o tempo, tornando-se cada vez mais sutil
e cruel.
A família de retirantes
de Vidas Secas vivencia o drama da falta: de um lar, de um futuro, de uma
linguagem. A constante ameaça da seca lhes impõe uma vida nômade, sem
perspectivas, guiada pelo instinto de sobrevivência. No sertão, o inimigo é a
natureza; na cidade, o inimigo é o próprio homem. Em A Hora da Estrela,
Macabéa, alagoana que se muda já adulta com a tia para o Rio de Janeiro, causa
pena, repulsa e revolta nos outros personagens, no narrador e no leitor. Feia e
desajeitada, alimenta-se de cachorro-quente com Coca-Cola, por ser barato,
ganha menos que um salário mínimo e seus pequenos luxos consistem em pintar as
unhas de vermelho e ir ao cinema uma vez por mês. Sua condição é de completa penúria.
Fabiano e Macabéa, nordestinos, “bichos da mesma espécie”, sofrem, de modos
distintos, a violência de uma existência invisível. E são conformados: não
contestam nada, por não saber como nem a quem e acham natural a exploração que
sofrem.
AYRES, Nicole. Disponível
em: https://homoliteratus.com/a-voz-dos-excluidos-na-literatura-vidas-secas-e-a-hora-da-estrela/#:~:text=Os%20dois%20narradores%20s%C3%A3o%20cultos,personagens%20%C3%A9%20a%20mesma%20que.
Fragmento, com adaptações.
Acesso em 27.ago.2021.
Texto II
O teórico Terry Eagleton afirma que na Inglaterra do
século 18 o conceito de literatura não se limitava aos escritos “criativos” ou
“imaginativos”. Abrangia todo o conjunto de obras valorizadas pela sociedade:
filosofia, história, ensaios e cartas, bem como poemas. Não era o fato de ser
ficção que tornava um texto literário, e sim sua conformidade a certos padrões
de “belas letras”. O caráter ideológico dos textos literários servia de
mecanismo para legitimar os interesses de um grupo social, e não de todos.
Temas como racismo, colonialismo, práticas machistas e homofóbicas, por
exemplo, por muito tempo não foram questionados, justamente por comprometer e,
talvez, desestabilizar o poder hegemônico social, isto é, o cerne da sociedade.
É perceptível que em meados do século 19 e início do século 20, em pleno
processo de desenvolvimento mundial, a sociedade não parecia reconhecer de
nenhuma forma a importância e o valor do negro como ser humano e ser social, nem
a mulher como indivíduo potencialmente capaz. Obras como as de Monteiro Lobato
e Machado de Assis, no Brasil, nos dão esse panorama. Logo, por meio da arte e
da literatura, esses e tantos outros traços do comportamento e das relações
sociais foram apresentados ao leitor. Se tudo isso serviu para humanizá-los, pode-se
considerar que foram inevitáveis o choque e a tomada de consciência, a partir
dessas provocações.
DERING, Renato de
Oliveira e SILVA, Thaís Fernanda,
in Diálogo entre ficção e realidade: a
linguagem literária como uma das representações de mundo.
Fragmento, com adaptações.
Acesso em 27.ago.2021.
Texto III
Como disse Bandeira, "A poesia está em tudo
— tanto nos amores quanto nos chinelos, tanto nas coisas lógicas quanto nas
disparatadas”. Isso equivale a dizer que há um lugar, ao mesmo tempo, grave e
açucarado para escrevermos a briga do casal, a alta da bolsa de valores, o
preço do feijão, a pandemia – esse lugar é a Literatura, que tem como
pressuposto não só o enlevar mas também, e principalmente, o provocar. A
Literatura, ao contrário do que alguns desavisados consideram, presta-se a dar
voz aos marginalizados sociais, matéria-prima dos mais consagrados escritores. No
milênio passado, o francês Victor Hugo jogou luz ao miserável Jean Valjean, que
cumpriu vinte anos de trabalhos forçados, por ter furtado frutas aos sobrinhos
(...); com os pequenos delinquentes da praia soteropolitana, na voz de Jorge
Amado, foi revelado o fracasso das instituições públicas no combate às
desigualdades sociais (...), de um Brasil que faz, da fome, a principal moeda
de campanhas eleitoreiras (...); Graciliano Ramos, como que autobiograficamente,
trouxe o menino mais novo e o menino mais velho, estereótipos da infância
invisível, que não tem querer, nem brinquedos, nem cadernos (...). Sim, a
Literatura nos provoca.
Gislaine
Buosi
Com
base nos textos apresentados e em seus próprios conhecimentos, escreva um texto
dissertativo-argumentativo, empregando a norma-padrão da língua portuguesa,
sobre o tema:
“Qual é o verdadeiro papel da Literatura no combate à invisibilidade
social?”