EM - DISSERTAÇÃO - MODELO UERJ - DESUMANIZAÇÃO DA VIDA E BANALIZAÇÃO DA MORTE - A PARTIR DE "NÃO ME ABANDONE JAMAIS
UERJ
DESUMANIZAÇÃO DA VIDA E BANALIZAÇÃO DA MORTE
DISSERTAÇÃO MODELO UERJ
a partir da obra literária “NÃO ME ABANDONE JAMAIS”, de Kazuo Ishiguro
ID: GWT
A Universidade Estadual do Rio de Janeiro selecionou a obra “Não me abandone jamais”, de Kazuo Ishiguro, obra vencedora do prêmio Nobel de Literatura em 2017, como base para o tema da Redação.
Sinopse da obra: Kathy, Tommy e Ruth são clones criados para doar órgãos. Tendo esse cenário de ficção científica por pano de fundo, e o triângulo amoroso como gancho, Kazuo Ishiguro fala de perda, de solidão e da sensação de que às vezes temos de já ser "tarde demais". (...) Kathy H. tem 31 anos e está prestes a encerrar sua carreira de "cuidadora". Enquanto isso, ela relembra o tempo que passou em Hailsham, um internato inglês que dá grande ênfase às atividades artísticas e conta, entre várias outras amenidades, com bosques, um lago povoado de marrecos, uma horta e gramados impecavelmente aparados. No entanto esse internato idílico esconde uma terrível verdade: todos os "alunos" de Hailsham são clones, produzidos com a única finalidade de servir de peças de reposição. Assim que atingem a idade adulta, e depois de cumprido um período como cuidadores, todos têm o mesmo destino - doar seus órgãos até "concluir" (morrer). Embora à primeira vista pareça pertencer ao terreno da ficção científica, o livro de Ishiguro lança mão desses "doadores", em tudo e por tudo idênticos a nós, para falar da existência. Pela voz ingênua e contida de Kathy, somos conduzidos até o terreno pantanoso da solidão e da desilusão onde, vez por outra, nos sentimos prestes a atolar.
Especialistas dizem que o número total de mortes registradas provavelmente é subestimado (...). Ucrânia e Rússia afirmam que o número de mortos chega a dezenas de milhares, mas suas afirmações se contradizem e não há meios de verificá-las de forma independente. (...) "No total, nós estimamos [além das mortes confirmadas] que pelo menos 3 mil civis morreram em cidades sitiadas porque elas não conseguiram atendimento médico e por causa do estresse sobre sua saúde em meio às hostilidades", afirma a chefe da Missão de Monitoramento dos Direitos Humanos da ONU na Ucrânia, Matilda Bogner. (...) "Todos os dias, a guerra tira dezenas de vidas de civis e de combatentes", diz Bogner. "Se vidas humanas importam, esses números falam por si."
Sarah Habershon, Rob England, Becky Dale e Olga Ivshina - Da BBC News. 4.jul.2022
Se por um lado esse retorno das atividades é defendido por alguns, o painel de óbitos nos anestesia. A dor é ainda maior naqueles que testemunharam a letalidade de um vírus que acabou com os planos de tantas famílias nos últimos meses. Mas a banalização desse elevado número de mortes é indicativo de que a sociedade está fora dos eixos, conforme explica a psicanalista Katia Radke. Para ela, insistir nesse projeto de suposta normalidade é uma arapuca. “Essa ideia de ‘novo normal’ é um equívoco, um clichê, porque é a banalização da dor e de uma tragédia”, reflete a integrante da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre. (...) “Essas marcas vão perpassar gerações. As crianças e adolescentes estão vivendo assombradas com isso (a pandemia). Não sei se vão conseguir andar na rua tão à vontade, se vão se abraçar tanto”, especula Katia.
Negacionistas morreram primeiro: Negar o número de mortos ou banalizá-lo custou caro em pandemias passadas. Segundo a professora Nikelen Witter, os negacionistas foram os primeiros a morrer de cólera, pandemia que traumatizou o mundo no século 19.
Manoel Moisés Cavalcante atuava como promotor de vendas em um supermercado, quando sofreu um infarto que o levou a óbito. A loja não interrompeu as atividades. Consumidores continuaram a comprar, trabalhadores continuaram a cumprir ordens. Pouco depois, aqueles produtos que esconderam o corpo de Manoel estariam nas estantes. A banalização da morte de trabalhadores não é novidade (...).
Tornou-se lugar-comum dizer que algum grau de miopia social é necessário para seguirmos vivendo. (...) Pouco a pouco nos dessensibilizamos ao sofrimento do outro e, de súbito, acordamos desse estado letárgico com um retrato que diz: o respeito pelo falecimento de um trabalhador vale menos do que o lucro com as vendas do dia. Desse duro despertar advêm indignação e notas de retratação, seguidas de esquecimento.
Estávamos estudando algum poema, mas, por algum motivo, o assunto se desviara para os soldados da Segunda Guerra Mundial encerrados em campos de prisioneiros. Um dos meninos perguntou se as cercas em volta dos campos eram elétricas, e aí alguém falou que devia ser muito estranho viver num lugar assim, onde as pessoas podiam se suicidar quando bem entendessem simplesmente se encostando numa cerca. (...) Mais importante ainda, demonstramos para o mundo que, quando criados num ambiente humano e culto, os alunos podiam se tornar tão sensíveis e inteligentes quanto qualquer ser humano normal. Antes disso, todos os clones — ou alunos, como nós preferíamos chamá-los — existiam apenas para abastecer a ciência médica.
Kazuo Ishiguro
Não me abandone jamais. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.
PROPOSTA DE REDAÇÃO: A partir da leitura do romance “Não me abandone jamais” e em suas próprias reflexões, escreva uma redação argumentativo-dissertativa, em prosa, com 20 a 30 linhas, sobre o seguinte tema: “A desumanização de vida e a banalização da morte são resultados da miopia social?