EM - DISSERTAÇÃO - MODELO UERJ - ARTE HUMANIZADORA - A PARTIR DE "NÃO ME ABANDONE JAMAIS"
UERJ
ARTE HUMANIZADORA
DISSERTAÇÃO MODELO UERJ
a partir da obra literária “NÃO
ME ABANDONE JAMAIS”, de Kazuo Ishiguro
ID: GWR
A
Universidade Estadual do Rio de Janeiro selecionou a obra “Não me abandone
jamais”, de Kazuo Ishiguro, obra vencedora do prêmio Nobel de Literatura em
2017, como base para o tema da Redação.
Sinopse
da obra: Kathy, Tommy e Ruth são clones criados para doar órgãos. Tendo esse
cenário de ficção científica por pano de fundo, e o triângulo amoroso como
gancho, Kazuo Ishiguro fala de perda, de solidão e da sensação de que às vezes
temos de já ser "tarde demais". (...) Kathy H. tem 31 anos e está
prestes a encerrar sua carreira de "cuidadora". Enquanto isso, ela
relembra o tempo que passou em Hailsham, um internato inglês que dá grande
ênfase às atividades artísticas e conta, entre várias outras amenidades, com
bosques, um lago povoado de marrecos, uma horta e gramados impecavelmente
aparados. No entanto esse internato idílico esconde uma terrível verdade: todos
os "alunos" de Hailsham são clones, produzidos com a única finalidade
de servir de peças de reposição. Assim que atingem a idade adulta, e depois
de cumprido um período como cuidadores, todos têm o mesmo destino - doar seus
órgãos até "concluir" (morrer). Embora à primeira vista pareça pertencer ao
terreno da ficção científica, o livro de Ishiguro lança mão desses "doadores",
em tudo e por tudo idênticos a nós, para falar da existência. Pela voz ingênua
e contida de Kathy, somos conduzidos até o terreno pantanoso da solidão e da
desilusão onde, vez por outra, nos sentimos prestes a atolar.
A arte e a humanização do
homem: afinal de contas, para que serve a arte?
Que importância há em conhecer Mozart ou Leonardo da Vinci, em ser
sensível e criativo para o mundo do trabalho, na época dos computadores e
satélites? Ou que importância tem a música erudita, o balé clássico ou a
pintura cubista, para uma multidão de analfabetos? Cultura inútil! No entanto,
a arte sobrevive - inutilmente ou não, todo mundo ouve música, dança, assiste a
filmes e se preocupa em pendurar nem que seja a gravura de um calendário na
parede. Do Renascimento até hoje, artistas são consagrados e se transformam em
ídolos. Os meios de comunicação de massa reservam um espaço significativo para
as manifestações artísticas. Por quê? Para quê?
Por mais que se imponha como atividade dispensável, a produção artística
não se justifica somente como luxo e decoração para as elites. Prova disso são
o rádio e a televisão que, através da veiculação de música, novelas e filmes,
ocupam a maior parte das horas de lazer da classe trabalhadora. Então, para que
serve a arte? Se todas as respostas ainda não convenceram, a prática teima em
contradizer o mito da inutilidade. O problema que se coloca então é o de
encontrar a resposta certa. É preciso fazer uma limpeza no terreno da arte, no
processo histórico de sua construção, na obra enquanto mercadoria, no consumo
privado, nos desvios provocados pelo modo de produção de nossa sociedade e
pelos valores (ou anti-valores) que produziu e produz. (...) Não há
possibilidade de escolha entre "o pão de cada dia" e o mais belo
espetáculo artístico para a maioria daqueles que, tendo garantida sua
subsistência, têm recursos "sobrando" para investir no deleite do
espírito. Está dada a sentença!
E agora? Voltamos ao começo: todas as aparências reforçam o papel
secundário da arte, mas ainda não dão conta de explicar sua existência. Precisamos
mergulhar nestas aparências que se manifestam na vida real dos homens, no seu
cotidiano, para encontrar respostas mais convincentes que possam mostrar ou
quem sabe até ampliar a importância da arte na existência humana.
TROJAN, Rose Meri.
Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/yPNx4p4rWhFFGzXqCff3T5j/.
Acesso em
28.jul.2022.
“A arte existe porque a vida não basta.” (Ferreira Gullar, poeta
modernista brasileiro)
Tommy se pusera então a relatar tudo. Mas, antes que chegasse à metade
da história, ela o interrompera e começara a falar. Conhecia uma porção de
alunos que durante um tempão haviam tido muita dificuldade em ser criativos:
pintura, desenho, poesia, nada dava certo para eles, e isso durante muitos e
muitos anos, contou ela. Aí, um belo dia, viravam uma página e desabrochavam.
Era muito possível que Tommy fosse um deles. (...) Nós selecionávamos o que
havia de melhor e organizávamos mostras especiais. No final dos anos 70, no
auge da nossa influência, montávamos eventos enormes por todo o país.
Compareciam ministros, bispos, tudo quanto é tipo de gente famosa aparecia para
nos prestigiar. Faziam discursos, concediam verbas. ‘Olhem, aqui está!’, nós
podíamos dizer. ‘Olhem só toda esta arte! Como é que vocês ousam dizer que
essas crianças não são inteiramente humanas?’ (...) Agora, meu jovem, me
explique por que minha Galeria ajudaria a reconhecer quem está de fato
apaixonado?” “Porque mostraria para a senhora como nós somos”, disse Tommy.
Madame interrompeu-o de repente: “Sua arte revela seu eu interior, claro! É
isso, não é? Porque a sua arte mostra a sua alma!” (...) “Está bem”, disse ela.
“Vamos prosseguir. (...) Você estava dizendo algo a respeito da sua arte. Como
a arte desnuda a alma do artista.” (...) Quando estava conversando com a
Marie-Claude. Você disse que era porque a arte revelaria como vocês eram. Como
vocês eram por dentro. Foi isso que você disse, não foi? Bem, pois saiba que
não está muito distante da verdade. Nós levávamos seus trabalhos porque
achávamos que eles revelariam a alma de vocês. Ou, para esclarecer melhor a
questão, fazíamos isso para provar que vocês tinham uma alma.”
Kazuo Ishiguro
Não me abandone jamais.
São Paulo: Companhia das Letras, 2016.
PROPOSTA DE REDAÇÃO: A partir da leitura do romance “Não me abandone
jamais” e em suas próprias reflexões, escreva uma redação
argumentativo-dissertativa, em prosa, com 20 a 30 linhas, sobre o seguinte
tema: "Arte – decoração e entretenimento ou estratégia para a reumanização do
indivíduo contemporâneo?"